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Varíola dos macacos: para além de evitar a infecção, evitar o preconceito

Em decorrência do surto internacional da varíola dos macacos ocorrido em maio de 2022, a Organização Mundial de Saúde (OMS) a declarou como uma emergência de saúde pública internacional. Desde então, a doença tem sido diagnosticada em vários países do mundo, incluindo o Brasil (https://torres.rs.gov.br/2022/08/25/entenda-sobre-a-variola-dos-macacos-ou-monkeypox/). Em nosso país, o número de casos confirmados duplicou no mês de agosto, chegando a 3,7mil pessoas infectadas, o que o coloca no terceiro lugar do rank dos 10 países com maior número de casos, ficando atrás apenas dos Estados Unidos e da Espanha (https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2022/agosto/conheca-o-cenario-epidemiologico-da-variola-dos-macacos-no-mundo-e-o-perfil-dos-casos).

A varíola dos macacos, provocada pelo vírus monkeypox, não é uma doença nova. O vírus foi isolado pela primeira vez em macacos em 1958 e o primeiro caso de infecção em humano foi verificado em 1970. Porém, segundo o consultor do Núcleo de Epidemiologia e Vigilância em Saúde (NEVS) da Fiocruz Brasília, Sérgio Nishioka, no atual cenário a doença se apresenta de uma forma clínica e de transmissão que ainda não tinha sido registrada. Embora de menor transmissibilidade e de ocorrência de casos graves, o especialista afirma que “A preocupação que se dá é pelo fato de a doença estar se espalhando de forma bastante rápida por um número grande de países” (https://dol.com.br/noticias/para/745287/saiba-tudo-sobre-a-variola-dos-acacos?d=1)

Em geral, os principais sintomas da varíola dos macacos são: febre, dores no corpo, linfonodos inchados, dor de cabeça, calafrios, fraqueza e erupções ou lesões na pele. A infecção geralmente ocorre a partir do contato próximo com uma pessoa infectada e que apresente lesão cutânea, feridas ou crostas. Também pode acontecer por meio de gotículas respiratórias ou fluídos orais durante o contato íntimo. Além disso, a infecção pode ocorrer pelo contato com tecidos, objeto ou superfícies contaminadas com o vírus (https://torres.rs.gov.br/2022/08/25/entenda-sobre-a-variola-dos-macacos-ou-monkeypox/). Então, como se proteger do vírus e impedir a infecção? Evitando-se o contato próximo e íntimo com pessoas infectadas, bem como fazendo uso de máscara, protegendo braços e pernas em situações de aglomerações, e higienizando frequentemente as mãos.

No que se refere ao registro dos casos, verifica-se que “[…] Ela tem sido diagnosticada com muito mais frequência em homens do que em mulheres e, basicamente, embora não exclusivamente, em homens adultos e que tinham praticado sexo com outros homens” (https://dol.com.br/noticias/para/745287/saiba-tudo-sobre-a-variola-dos-acacos?d=1). Porém, é preciso cautela na interpretação desses dados no sentido de evitar discriminação, estigma e, portanto, a exclusão em decorrência de gênero. Afinal, “É mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito”. Esta citação foi atribuída ao Einstein e faz referência às dificuldades que temos de rever ou abandonar categorias, precondições e preconcepções que usamos e atribuímos às pessoas, criando e fortalecendo estigmas através dos quais circulamos, consciente ou inconscientemente, uma série de preconceitos para operarmos dinâmicas nas relações pessoais, sociais ou políticas.

Erving Goffman (1988), na obra clássica “Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada”, argumenta, entre outras coisas, que estabelecemos um conjunto de exigências e expectativas normativas em relação ao outro, sem se importar com o que ele possa vir a significar ou impactar em termos de visibilidade e de relacionamentos sociais. Desse modo, a essa caracterização que demandamos para os outros, o autor chamou de identidade social virtual. Ou seja, aquilo que já está preestabelecido como norma de comportamento e de aceitação social. E a caracterização dos atributos e evidências que as pessoas realmente possuem, o autor designou de identidade social real.

É interessante notar que Goffman chama-nos atenção para a divergência socialmente criada entre essas duas características, provocando-nos a imaginar como as pessoas poderiam ser antes dos estigmas e dos preconceitos que dirigimos para elas, fazendo-nos repensar nossas formas habituais de classificar e categorizar pessoas, desacreditando ou valorizando atributos, uma vez que ao fortalecer o preconceito social de uma pessoa ou de um grupo, estamos confirmando a situação de normalidade de outrem, acreditando ou aprovando outrem. “As atitudes que nós, normais, temos com uma pessoa com um estigma, e os atos que empreendemos em relação a ela são bem conhecidos na medida em que são as respostas que a ação social benevolente tenta suavizar e melhorar (Goffman, 1988, p. 14).

Elaborando a questão do preconceito à luz da teorização e da prática da filósofa, Márcia Tiburi afirma que a sociedade do preconceito, aquela que não promove nem defende democracia nem direitos humanos, opera a partir da exacerbação do discurso de ódio, manipulado enquanto tecnologia política de orientação e de produção de poder de fato, ou seja, aquele que não é abstrato. Segundo Tiburi, essa tecnologia é um ato de fala que adota o ódio como combustível, como método de formação das relações políticas, seja na dimensão da linguagem, do pensamento ou da atitude. Foi-se moldando, portanto, uma conjuntura fundada no preconceito como fonte do ódio, e este pode ser atualmente ilustrado pela frase de Maquiavel no contexto do século XVI: “Um governante que não pudesse se fazer amar, poderia se fazer temer” (https://www.youtube.com/watch?v=wUQXa6Pz7rQ&t=623s).

Sandra Ataíde e Keyla Ferreira

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